quarta-feira, 13 de julho de 2016

Mulher que Deus criou para mim


Ofereces-me
o presente que quem nos criou
imaginou de perfeito para mim,
a tua vulva,
o embrulho do pecado,
pela gula que te tenho de te comer,
ai que se Deus me ouve perco-te,
mas pensa,
a sua omnipresença já me declarou,
ai que vou ao inferno pela tua pele,
pela tua vagina nua,
igual como ao mundo vieste.
A virgindade é, para mim, psicológica
e mesmo assim não somos virgens,
perdoem-me a sinceridade,
sei que pareço um puto na puberdade
que descobriu o clitóris,
mas o que me aconteceu,
foi que o céu desceu à terra,
para me chamar para o lado do diabo.
Vieste em quase carne seca,
numa sinistralidade absurda,
mulher que geme quase muda,
entraste pela portas do fundo,
num clube noturno,
com tabaco e poeira,
parecia que havia um sinal de Deus
para virar a cara para a dianteira,
a minha vida e morte começaram ali,
no primeiro minuto que te vi.
Mulher danada que as tuas ancas dançam,
como se trabalhassem para um processo de hipnotização,
vivemos um daqueles amores antigos,
se Camilo ainda estivesse vivo,
seríamos musas para outro Amor de Perdição.
Li na bíblia que Jesus nasceu de uma mulher virgem,
não tenho ideia de como foi a tua criação
mas, oh carne que eu amo, sei que nasceste para mim,
que a tua mãe carregou no ventre a história da minha vida.
Estou agradecido ao sexo por te fazer existir,
pelos teus pais se terem despido na noite em que te fizeram,
e nem quero saber se amavam,
se pecaram
ou se apenas procriavam como a religião nos pede.
Quem acredita que alguém poderá esperar por ter um anel no dedo para ter prazer,
nunca conheceu nenhuma mulher com o teu corpo,
com a tua genialidade de me fazeres tropeçar nos erros
que me farão arder internamente com todos os pecadores
mas, oh quem julga os meus erros, diga-me se não concorda:
pecado era não te ter feito marcar as minhas costas,
ver-te de bochechas rosadas,
e de olhos semicerrados.
Tu, que sei lá porquê apareceste,
que parece que carregas
Maria Madalena na alma,
discípula de Deus
que mostra-me que a igreja está errada por não aceitar o prazer carnal.
Oh corpo que a mim me sacia,
tu mulher que pareces perdida,
rezemos juntos,
despidos,
iremos confessar,
semanalmente
pois o pecado de coexistirmos nas mesmas quatro paredes
faz-nos ser pecadores regulares.
Desculpem-me os mais fieis,
os erros dados pela pele,
pelos orgasmos,
gritos e roupas no chão
mas algo que prometo é que nunca cometerei adultério,
a esta mulher, senhora, que Deus criou para mim.
amen

-MariaCunhaSilva














terça-feira, 12 de julho de 2016

Para ti que sabes o meu nome


     O tempo passa e o que te prometi mantem-se, amei-te como nunca voltarei a amar ninguém, com a minha falta de maturidade, com as hormonas as saltos e com um sorriso patético e lágrimas no rosto.
      Lembro-me de ti nos comentários das minhas amigas, nas conversas de café e numa fotografia que guardo numa gaveta que ninguém mexe para não vir o passado ao de cima de novo. Já chegaram os mais de trezentos e sessenta e cinco dias que te amei para não andar agora a reviver-te em pequenas partes da pessoa que sou sem ti, uma pessoa nova e sã. Amar-te destruía a minha sanidade e a necessidade que tive durante meses de esquecer-te enlouqueceu-me ao ponto de ainda hoje chorar quando recordo os pratos cheios pela minha alma vazia, a fome que tinha de ti mas que nada o mundo me oferecia para me querer alimentar de novo, seja como metáfora ou realmente. Não comia e tu não aparecias.
      Conheci muitas pessoas, histórias de vida e olho para o mundo de uma forma redondamente diferente e bem lá no fundo gostava que ainda aqui estivesses, como ouvinte para te contar tudo aquilo que acredito agora. Não sei bem o que te diria, deixei de encenar discursos desde há muito mas imagino a tua cara de surpreendido por tudo que me tornei. Estou mais forte e mais fraca simultaneamente, não sei como te explicar nem explicar a ninguém o que sinto. Há caminhos que tracei e onde cai e outros onde caminhei suavemente e sei que todos eles aconteceram pela decisão que tomámos juntos de nos deixarmos prematuramente. Obrigada por me teres feito uma mulher, mesmo que saiba e não queira acreditar, para não te culpar, que conseguiria tornar-me uma se envelhecêssemos lado a lado.
     Sei que odeias as palavras, as estrofes, tudo o que nos faz renascer tanto tempo depois mas a beleza disso é tão bonita, é metafórica e eterna. Não o desejas, nem por um segundo em que lês?
     Nunca conseguimos acabar com tudo, tínhamos a aptidão autodestrutiva de reatarmos, de nos beijarmos e nos contactarmos mesmo que não me amasses, como tu afirmavas. O mundo ofereceu-nos a vantagem de largarmos tudo, deixarmos cair por terra memórias e possibilidades de recomeço e nós agarrámo-la tal como nos devíamos ter agarrado no dia em que em lágrimas dizíamos que não havia modo algum de estarmos lado a lado.
Apaixonámo-nos, talvez não tão perdidamente, porque ambos temos cicatrizes tão profundas que nos assustam quando pensamos em relacionamentos. Deixámos de gostar de amar mas amámos outras pessoas, beijámos corpos na procura do que já não podíamos ter juntos e gritámos em plenos pulmões o odio que há entre nós. Odeio-te por teres feito o que me fizeste e por teres deixado de querer o mesmo que eu - tu também me odeias por isso.
      Depois de tudo isto vem as comparações, a necessidade irracional que o nosso cérebro tem de nos dizer que fomos melhor que aquilo que temos com alguém ou que o que temos atualmente tem uma valorização maior do que algo que alguma vez tivemos. Tento resistir às tuas passagens ocasionais quando penso no que sinto mas tu sempre apareces, como se fosses a confirmação para tudo o que posso estar a sentir atualmente. Preciso de ti, das nossas memórias para ter a certeza de que amo mais hoje do que nunca.
      E acredito, que foste o amor da minha vida até agora mas que provavelmente não o serás para sempre, assim como agora já não és o homem que mais amei. Marcaste-me mais com a tuas recaídas, com as minhas lágrimas perdidas por ti, pelo amor desvalorizado, pelo tempo que não tivemos mas que devíamos ter tido, pelos desgostos e desilusão. O amor que me deste foi sempre amaldiçoado, com tombos mal dados, com cales e gritos no silêncio que partilhávamos e até agora, até este momento não há alguém no mundo que me tivesse marcado tanto de tão mal me ter feito ficar e é por isso que não te esqueço, que não escrevo e te uso como musa para a poesia que trata de sarar as feridas que causaste.
       Agora só nos resta que o tempo passe, que as canetas se cansem de ti e que o titulo que a ti te dou alguém te tire por boas razões, agora apenas basta andar de cabeça erguida, de mão dada com o melhor presente que o presente me poderia ter oferecido, ele que não te conhece mas te inveja, ele que não sabe o teu nome de cor mas que beija a pele que um dia deixaste de amar, ele que me seca as lágrimas quando lhe conto o meu passado e lhe peco que não faca o mesmo.
       Sei que te achas o herói da história, o que sagra a vitória com louros mas a vitória está em mim, por me ter levantado infinitamente, por ter sabido sair a tempo de camas de que não amava e por ter apenas a certeza que te tinha deixado de amar quando todo o sangue que corria em mim acreditou que sim, não como tu que te arrependias de me teres dito que já não havia sentimento no segundo a seguir ao proferires.
       Agora chegará o tempo de assinar o meu nome, para que o mundo saiba que sou eu que passo estas palavras para o papel mas eu sei, que nesta altura já saberás quem escreveu tal prosa e por isso sorrio e tu te enervas, pela impossibilidade de absolvermos o passado que tivemos, os pontos que conhecemos um do outro e tudo aquilo que partilhámos. Aqui vai, não para ti que sabes o meu nome mas para os outros todos que não sabem o teu:

-MariaCunhaESilva



quarta-feira, 6 de julho de 2016

Os meus filhos e o mundo



Disse ao meu marido que queria que o nosso filho pudesse escolher a cor do quarto, sem ser azul ou verde e que eu ficaria feliz se ele escolhesse cor-de-rosa, que reagiria exatamente da mesma forma. Afinal uma cor é apenas "a impressão que a luz refletida ou absorvida pelos corpos produz nos olhos", ou não?
Todo esse pensamento foi difícil de entendimento mas deu a chance de eu levar a minha ideia à frente apenas por haver a possibilidade do nosso filho escolher o que são chamadas "cor de menino".
Laranja, que cor linda, amor. Dissemos para o nosso filho que teve a oportunidade de escolher. Afinal a vida é feita de escolhas, porque não oferecer uma tão básica?
Disse à minha mãe que a minha filha queria uma boneca preta e não mais uma branca que todos lhe dão. Fomos à loja e:
- Pedimos imensa desculpa mas temos outros artigos, bonecas de olhos azuis e pele branca. Não acha mais bonito? - Fiquei perplexa, como é que o nosso futuro, o futuro da humanidade poderá ter sucesso se desde que nascem são atribuídos estereótipos de beleza errados?
Lá mandamos encomendar pela internet o que a minha filha queria, dois segundos depois da entrega conseguia-se ver a felicidade nos olhos dela.
Que boneca mais linda, amor. Disse à minha filha que teve a oportunidade de ser feliz sem racismo nas suas escolhas. Afinal o mundo é de todos e a beleza nele está nas diferencas, não é?
O meu filho disse-me que queria uma barbie, contei aos meus amigos e as reacões foram as esperadas, "Não lhe vais dar isso pois não?", "Ele vai ser gozado pelos miudos todos, não lhe dês isso", "Um miudo não pede esse tipo de coisas, diz-lhe isso". Fui ao supermercado mais próximo e ele lá escolheu o que queria, a barbie dele e depois disso, mesmo que não tivesse que me justificar a alguém, respondi a todos os que me questionaram o porquê de lhe ter feito tal vontade.
Sim vou lhe dar o que quer assim como daria um carro se me pedisse.
Sim, tenho a perfeita nocão que poderá ser gozado pelas outras criancas mas isso ele aprenderá com a vida, que para sermos aquilo que somos e para termos aquilo que queremos vamos ouvir comentários e criticas mas todos os miudos que comentarem algo menos positivo com o meu filho são o reflexo de uns pais que estão sobre as ordens do que a sociedades lhes exige e um meu filho será apenas alguém a ser feliz porque é isso que a vida foi feita.
E sim, um miúdo pede isso assim como uma miúda pode pedir um carro. Devemos mostrar desde o início da vida deles, daqueles que um dia vão dirigir o mundo, que por terem nascido com um género não significa que os seus sonhos terão de ser x e não y. Afinal há chefes de cozinha ótimos e engenheiras ótimas. Não é? E toda essa possibilidade de vivênciarmos isso vem da evolucão e evoluir é entender que os brinquedos são para todos, desde que gostem e sejam felizes, assim como as carreiras.
Disse ao meu pai que não valia a pena comprar para minha filha vestidos, que todos eles estão guardados em armários ou foram dados a alguém.
- Uma menina tem de ser femina, filha. Tu és e a tua mãe também e é por isso que eu me apaixonei pela a tua mãe e o teu marido se apaixonou por ti. Uma menina tem de usar vestidos, faz parte, se ela não gosta por favor, obriga-a.
Não pai e não mundo, a minha filha não vai andar com laços na cabeça e com vestidos se ela não se sentir bem e confortável. O corpo é dela e a felicidade de vestir o que gosta não a posso, nem devo tirar. Aliás, o ser feliz é feito de vários pedaços de momentos e como é que eu, como mãe, poderia dizer que faço tudo para ver a minha filha com um sorriso no rosto se lhe tiro o prazer de se vestir? Prefiro ver a sua personalidade nos trapos que carrega do que ver a sociedade lá encardida.
Disse aos meus filhos, sejam felizes, lutem por quem são que o mundo está repleto de pessoas que pretendem ser alguém por ser tão cansativo ser realmente o que são, tentem e não se acomodem só por ser o mais fácil, façam do mundo um lugar com humanidade já que até agora não passa de um lugar com pessoas.


-MariaCunhaESilva