Escrevo e amo sem pensar e ainda estou à espera que a vida me diga se é um defeito ou uma qualidade.
quarta-feira, 30 de novembro de 2016
Eu também, meu amor
As lágrimas voltam.
Olho para a tua fotografia que não sei porque ainda a guardo.
Lá continuas tu, tal como eu te conheci. Intocável e invejável como sempre. Sempre te invejei mesmo quando te tinha, sempre quis ter a tua calma e a tua lógica mas eu sou uma triste romântica que deixa que as pernas lhe tremam. Sempre invejei a tua certeza tão falsa quanto os anos que dizias que carregavas.
Choro pelas saudades e pela maldade que me ataca.
Quero-te de volta pelo amor e também pela vontade de te gritar, então peço que não voltes pois não te quero magoar mesmo que saiba que nunca te feres e que mesmo que o fizesse, eu tinha razões para tal.
Começo a falar sozinha enquanto na minha cabeça estás a dar-me respostas. Mudo o discurso mas de pouco vale, nunca arranjo palavras suficientes que me façam acreditar que se te as disser, tu voltarás com todo o amor que tinhas.
A minha mão está húmida, até mesmo sem ninguém a ver-me tenho medo de chorar por ti. Não há qualquer motivo lógico mas há incontáveis razões que só eu entendo.
Quando penso que não te amo, lá vens tu descaradamente lembrar-me do que foste. Porra que eu tenho saudades tuas e porra que tu não voltas.
As lágrimas param, deixo a tua fotografia precisamente no mesmo lugar com medo que alguém se aperceba que lhe toquei, com medo que alguém perceba que ainda te amo. Vou buscar o primeiro caderno e a primeira caneta velha que me aparece à frente e seco a tristeza e as saudades que se alimentam de mim nas letras que se arrancam da minha alma e lá continuamos nós, tal e qual como eu nos conheci, intocáveis e invejáveis. Se eu nos tivesse visto na rua ainda hoje pensaria que eramos para sempre, eramos daqueles casais que andam em passos pequenos por saberem que a vida lhes vai ser eterna.
As lágrimas voltam de novo.
Olho para as páginas velhas e soltas que não sei como ainda não se cansaram de mim.
Choro pela raiva de nunca vir entender o que nos aconteceu e onde ficaram as minhas falhas.
Todos os dias tenho palavras novas para te dizer, todos as manhãs me lembro que não falamos e que tudo aquilo que nos poderá curar está apenas em conversas e resoluções lógicas que somos incapazes de ter.
Porra que eu não sei como continuar a engolir discursos necessários que talvez te farão voltar ou que apenas me deixarão dormir em paz. Ambas são boas possibilidades mas o meu orgulho boia sempre enquanto o resto se afunda e o teu também porque porra, de certeza que eu não sou a única que tem algo a dizer.
A última vez que te senti foi com um apressado beijo na testa e com um "Espero que a vida te corra bem." e eu espero o mesmo mas não sei como me alimentar a vida toda com uma despedida tão simples ao amor da minha vida. Se pelo menos eu tivesse uma fotografia daquilo que foi o nosso adeus mas nem isso, despedi-me de ti com um "até já" mas nunca nenhum de nós conseguiu engolir os sapos para voltar ao lugar do reencontro prometido.
Eu também me culpo, pelos discursos poéticos que ninguém tem paciência mas que continuo a gritar nas ruas gélidas que um dia já aquecemos, pelas memórias desapropriadas que me nascem na cabeça e que não mantenho para mim e pelos livros que já escrevi para ti mas tudo isso, todos esses erros teriam resolução e sentido se quisesses estar aqui, a meu lado, perto de mim. Os erros de alguém que ama só podem ser considerados erros se a outra pessoa não lhe oferecer reciprocidade.
Parece-me que o choro acalmou e paz regressou.
Ao longe vejo a tua fotografia que parece revelada à pouco tempo mas que na realidade já tens uns bons anos de vida.
Nunca pedi que deitasses o que te dei para o lixo. Nunca me pediste para esquecer aquilo que tivemos. Aliás, ambos quisemos guardar tudo aquilo que tínhamos vivido e oferecido com a alma e corpo e tudo isso doeu, para ambos mesmo que na altura me parecesse que só a mim me doía. Não imagino onde está tudo aquilo que um dia nos pertenceu, se guardas espalhado pelo chão da casa e pelos armários tal como eu faço ou se colocaste em caixas com etiquetas para um dia, se quiseres, reaver tudo aquilo que já tiveste.
Eu estou a escrever-te e a minha cara está seca e áspera de novo, parece-me que está a voltar a altura em que tenho de fingir que nunca existimos e que nunca fui outra pessoa, mais feliz e mais livre. Tão livre por estar presa a algo que queria mais do que a carne que me faz ser alguém. Então, acabo assim este texto, sem palavras consistentes para o conseguir fazer como devia, sem vontade suficiente para me despedir na única forma que tenho de te contactar, pela minha escrita. Falta-me a coragem para pedir-te uma última conversa das mil que já tivemos e para pôr um ponto final neste paragrafo ridículo que nunca irás ler.
"Espero que a vida te corra bem."
Eu também, meu amor.
-Maria Cunha e Silva
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