Lembro-me de como odiavas as pessoas,
como me contavas detalhes que eu não reparava.
Nunca fui boa a entender que há quem não valha a pena.
Recordo-me de como me falavas, como se tivesses a experiência de uma vida inteira às costas, podias não ter mas eu fingia que não sabia.
Eras o homem mais sábio do mundo, ouvia as tuas palavras como elas fossem a verdade absoluta.
Era tão burra mas tão feliz a teu lado.
Como mulher eu pouco valia mas como pessoa, uma pessoa que quer viver para sempre, eu estava em destaque.
Calava-me para te ouvir.
Tudo o que dizias mudava-me a cabeça, abria-me os olhos ou até os fechava.
Lembro-me de como dizias que eu era má a decidir os caminhos e as amizades.
Sempre pensei que do mau eu poderia chegar ao bom e depois ao excelente mas tu não acreditavas em fases, para ti o sucesso e o estrelato era atingível num só dia.
Na verdade, contigo e com os teus conselhos cheguei mais alto do que nunca mas também cai mais do que queria.
Nunca me falaste das quedas mas também nunca te imaginei esfolado pela vida, não sei se o erro foi meu por acreditar em ti ou teu por acreditares em mim e na possibilidade que era impossível, de eu ser como tu.
Nunca serei como tu, aliás, nunca consegui tornar-me no que tu querias que eu me tornasse, eu via-o nos teus olhos e sentia nas minhas veias a tristeza de tudo isso.
Não ser suficiente para quem se ama torna-nos insuficientes para nós mesmos.
Relembro-me de ti, com o teu queixo levantado e com a maior credibilidade do mundo, não te posso dizer que estavas sempre errado mas também não estavas sempre certo.
Eu apoiava-te, seguia para a esquerda se essa era a tua escolha mas mudava para a direita se tu também assim o fizesses.
O pior amor é o que nos tira a vida própria e eu queria tanto ser tua que tentava ser quem eu não era.
Era tão tua e tão pouco minha.
Hoje, estou diferente, cresci.
Passei de menina a quase-mulher se é que um dia eu consiga ser mesmo mulher.
No tempo vazio e nas quedas onde não me deste a mão eu ergui a minha bandeira.
Na falta de conselhos teus aprendi a ter opinião.
Amava-te tanto que tinha deixado de ser até menina.
Não era nada a não ser tua, culpa minha, eu sei.
Lembro-me das pessoas que não gostavas e que ironicamente se colocaram no meu caminho, elas ensinaram-me tanto sobre ti e sobre a vida.
Talvez não estivesses tão errado assim mas também não estavas tão certo como imaginava.
Algumas pessoas cortaram-me os pulmões com soluços secos, outras deram-me o mundo que eu recusei.
Não sei onde tu te baseavas na escolha de boas e más pessoas e nem imagino em que secção tu agora me colocas.
Quer tu digas, quer não, eu sou uma boa pessoa.
Hoje, vejo-te num barco naufragado à espera que alguém que socorra e a teu lado estão uns tantos que pertenciam à lista dos menos-bons e dos horríveis.
Dou-te alguma razão, alguns deles têm te vindo a destruir aos poucos e mesmo com aqueles que te querem acordar para a vida, tu não sais de um coma induzido que te faz estar na lista dos mais-ou-menos.
Tornaste-te em quem antes evitavas e quem antes te fazia virar para o outro lado da rua.
Tenho saudades de te ouvir devido aos teus olhos abertos em relação ao mundo.
Eu dava-te a mão e deixava-me ir.
Acreditava em ti da maneira que devia acreditar em mim.
Deixa-me triste ver-te um homem apagado, sem o nariz empinado e com experiências para contar.
Tornaste-te em apenas 'mais um'.
Lembro-me da tua voz a engrossar quando querias ver uma mudança em mim, lembro-me de como eu reagia aos teus incentivos.
Quem me dera ter esse poder em ti, fazer-te acordar da vida que levas e que agarras.
Há quem te ouve ainda hoje mas nunca ouvirão tão saborosamente as tuas palavras como eu as ouvias.
Eras o rei do universo e escolheste ser o príncipe de um reino de lata que está em ruína.
Em que dia fechaste os olhos?
Em que dia abri os meus?
Será que nunca conseguiremos ser os dois inteligentes juntos e com os olhos bem abertos enquanto andamos de mãos dadas?
-MariaCunhaESilva
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