quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Matemática dele


Nunca gostei de ti.
Usei-te para tapar os buracos que ele criou.
Usei-te e a mais uns quantos, já perdi a conta.
Nunca fui boa a matemática
Ele sabe disso.
No meio dos ramos de flores, tinha sempre pilhas para a calculadora.
Até aquele dia que ele chegou sem ramo.
Era apenas uma flor, não havia contas para fazer.
"Assim não tens de te preocupar com cálculos"
Sorriu-me e disse que ia ensinar matemática
"Precisas de quantas aulas para voltares para mim?", disse-me que não sabia.
"Como é que podes ser professor se nem sabes o número de horas que vais estar numa escola?"
Nunca me respondeu, pediu a calculadora e lá foi ele.
Acenou ao longe enquanto pedia desculpas, na mão tinha uma pasta e livros.
Eu fiquei com as pilhas gastas e com um amor subtraído.
Até chegares tu e outros corpos que se deitam na minha cama.
"Qual é a tua disciplina preferida?"
"Matemática"
"És boas em equações?"
"Mais ou menos" minto.
E assim ficas um tempo a quebrar o silêncio da casa sem ele.
Trazes-me pilhas no meio de tulipas mas tu esqueces-te sempre que eu já não tenho calculadora.
Ele levou tudo.
Deixou-me aqui com papeis de cálculos que ele escreveu.
Eu não entendo as revoluções mas tenho saudades.
Dizes-me que sabes contar até cem.
Digo-te que ele sabia contar até mil.
E no meio de somas, multiplicações e substrações digo-te para ires.
És um resultado inconclusivo, as tuas comparações fazem com que me lembre mais dele do que quando estava sozinha.
Leva os teus cem números e as pilhas.
Eu fico bem aqui a contar com os dedos na esperança que ele me traga de volta a calculadora.
Nunca te amei.
A ti ou aos teus algoritmos por isso vai.
Eu só gosto da matemática dele.

-mm


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