terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Desculpa mãe


Desculpa mãe mas quero ser como os outros.
Desculpa mãe mas não quero deitar-me ao teu colo a dizer-te o quanto estou quebrada.
Desculpa mãe mas quero a irresponsabilidade da minha idade.
Desculpa mãe mas não quero viver o amor da minha vida neste momento.
Desculpa mãe mas quero pensar em mim por agora.
Desculpa mãe mas quero beber até deixar de sentir os lábios e quero esconder-te que passei uma noite sem noção da quantidade de álcool que as minhas veias acolheram.
Desculpa mãe mas não quero ser a tua menina infeliz que pede que nunca te vás embora.
Desculpa mãe mas não quero ter o coração quebrado de novo.
Desculpa mãe mas quero usar um daqueles vestidos que sempre achei curtos demais.
Desculpa mãe mas não quero dar importância ao amor e ao para sempre que sei que não existe.
Desculpa mãe mas não quero dar de mim como me dei este anos todos.
Desculpa mãe se estou mais fria mas é que estou mais feliz assim.
Não imaginas a quantidade de vezes que quebrei a cara e perdi o chão a tentar ser como tu.
Eu prefiro não amar nada pois quando não há sentimento não há perda.
Desculpa mãe se escolhi o lado mais fácil, o egoísmo.
Existe um numero incontável das vezes que me ofereci por inteiro para acabar quebrada. Tentava juntar os cacos de alguém para no final essa mesma pessoa me tornar em pedaços soltos.
Prefiro manter a minha sanidade do que perde-la por um alguém que me vai abandonar.
Desculpa mãe se achas que me perdeste mas nunca me tiveste tão inteira.
Sempre te entreguei o mínimo e preenchia-me com os teus beijos na testa. Atualmente estou completamente sã e pronta para fazer o meu caminho sem precisar do conforto da tua mão na minha cara.
Desculpa mãe mas cresci.
E com todo o crescimento chegou uma nova pessoa, chegou um novo eu com uma capa de proteção e com um passo atrás para todos aqueles que chegam. Chegou um novo alguém que se reserva, que se guarda e que não se dá por inteiro. Chegou uma pessoa feliz, inteira e não quebrada, que juntou os cacos das suas perdas e que não dá a permissão a mais ninguém para ser possivelmente partida como no passado.
Desculpa mãe mas sou feliz mesmo que seja fria como nunca tinha sido a minha vida inteira.

-mm




Desabafo


Sempre agi na maneira correta, educada, esperada e dentro dos limites.
Quebrava as regras que todos quebravam.
Pensava nos outros em vez de mim e no final recebia como consequência o mesmo que aqueles magoavam os sentimentos de alguém.
Não quebrava nada a não ser eu mesma.
Não partia o coração de ninguém a não ser o meu.
Ando-me a desligar do mundo e da reputação que mantinha.
Dava o melhor de mim sem ninguém se aperceber.
Acho que nunca ninguém me perdeu, todas as pessoas que deixei de ter foram por escolha própria e o pior de tudo é saber que não podia melhorar ou dar mais do que aquilo que estava a dar.
Revejo a minha vida como um ciclo repetitivo de aceitação dos outros e o que me bastava era apenas a minha aceitação.
Choro com pessoas, beijo e abraço mas nunca senti que alguém quis realmente chegar ao fundo a nível psicológico.
As pessoas imaginam que me conhecem mas acho que ninguém quis perder tempo comigo.
Já perdi muito na vida, até mim própria.
Já andei a vaguear por este planeta e as mãos que me seguraram já aqui não estão. Ajudam-me a levantar e depois vão se embora deixando-me cair sozinha.
As mãos que me carregam durante um mês abandonam-me no dia a seguir.
Aprendi a segurar-me sem a ajuda de ninguém e todos suplicam que volte ao que era.
Têm saudades da minha fragilidade pois era isso que os tornava fortes.
Eu sobrevivi a tremer no meio de um mundo que me mostrava o pulso cerrado.
Acho que jamais sentirei a ida de alguém, já perdi demasiadas pessoas para acreditar que algo dura o suficiente.
Estou cansada de segurar o mundo dos outros enquanto o meu se desmancha.
Calo-me e pensam que não me doi mas não há dor maior no mundo que aquela que não sai dentro de nós.
Nunca me perguntam se estou feliz, tenho de ser eu a gritar em voz alta para todos saberem e quando acabado por fazer algo que no passado nunca iria fazer ninguém se questiona se o fiz para encontrar a felicidade que ando à procura.
As mesmas pessoas que me curam são aquelas que me colocam uma corda ao pescoço.
Estou cansada de dar de mim a outros que uns meses depois desaparecem ou a outros que aparecem na minha em soluços doentios.
Vivi sempre para os outros enquanto toda a gente pensava que estava a fazer algo por mim.
Menti para ver sorrisos naqueles que amo mas estou cansada de amar.
Há demasiadas feridas nos joelhos, demasiados cales nas mãos e demasiadas lágrimas no meu rosto.
Desisti de ser quem era para poder ser o que sempre quis ser, um eu inteiramente feliz.
Andei numa busca insaciável para encontrar a paz de ser a escolhida e nunca encontrei, vivia a desculpar-me por todas as ações, vivia numa tentativa de perfeição sem sentido.
Havia a possibilidade de errar para todos os outros mas não para mim.
Ouvia pessoas a dizerem que queriam a minha vida mas mal elas sabiam o quanto perdida eu estava.
Alimentava-me de algo que não tinha sabor só porque tinha sabor para um outro alguém.
Ofereci o meu sorriso falso e nunca ninguém se apercebeu e agora que eu estou curada culpam-me por ser feliz. Eu até poderia querer saber de todas as opiniões há uns meses atrás mas agora encontro-me num lugar diferente com uma vida direita e correta a meus olhos em diversos aspetos.
Não me lembro do dia que me perdi no passado ou se tive perdida a minha vida toda numa tentativa de não cansar ninguém com a minha infelicidade mas sei que me encontrei agora.
Guardo rancores de todas as pessoas a quem dei o poder de me magoarem. Tornei-me mais fria e calculista mesmo que ainda seja romântica e iludida numa outra parte de mim.
Passei anos a questionar se ia magoar alguém em todas as mínimas escolhas que fazia, nunca achei correto dar-me uma oportunidade de ser genuinamente feliz se perdesse a possibilidade de ver o sorriso de alguém com quem partilhava histórias.
Sempre me chamaram de egoísta e egocentrista e o mais irónico é que sempre foram pessoas pela qual dava a minha vida que me diziam isso. Acho que ninguém entende a dor de não conseguir dar mais do que aquilo que já se ofereceu e mesmo assim não ser suficiente e era assim que passava os meses, a não ser suficientemente boa para ninguém nem mesmo para mim própria.
Acho que ao longo do meu percurso já perdi mais do que ganhei mesmo que algumas perdas sejam ironicamente mais um ganho do que outra coisa.
Houve sempre problemas cravados na minha pele, crianças que não me sorriram de volta, amores que não me amaram para sempre e uma família que nunca estaria preparada para um passo em falso meu.
Passei todos estes anos numa avaliação para os outros da pessoa que sou e mesmo assim ninguém me conhece perfeitamente... sabem a minha cor preferida, o quanto gosto da praia ou a quantidade de vezes que já vi determinados filmes mas nunca conheceram todas as minhas feridas abertas.
A minha tristeza iria atrapalhar a vida daqueles que não desejam parar, então reservo todas as memórias que me magoam como aquelas garrafas de vinho de reserva.
Há uma minoria de pessoas que pensa conhecer a profundidade que sou mas não chegam a ter nem a um terço de tudo aquilo que sou e guardo. E com esta afirmação sinto que tenho de pedir desculpa, como sempre.
Nunca senti que alguém me estivesse realmente ouvir devido a preocupação, era sempre curiosidade.
Sou tão frágil e ninguém consegue reparar nesse pormenor que muda tudo aquilo que sou.

-mm







quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Desta vez, meu amor


Já não me lembro de ti mas estás cravado nos meus lábios.
Quando ele me beija imagino-te ali comigo mesmo que já não te queira.
As comparações não param mesmo que o amor já não exista.
"Acredita em mim" "Não posso"
"Amo-te muito" "Não me digas isso"
Corto o meu relacionamento com ele por nós por tudo aquilo que fomos mesmo que já não o sejamos.
Ele pergunta-me se tenho saudades tuas e eu, em lágrimas, digo que tenho saudades da pessoa que era a teu lado e que não acredito que consiga voltar a ser com mais alguém.
Já experimentei diversos tipos de felicidade mas nunca há uma que se compare aquela que me oferecias.
A paz de estar a teu lado e não desejar mais ninguém.
A certeza que nunca tinha amado tão fortemente na vida.
Ele não me oferece isso mesmo que me dê o mundo inteiro. Eu quero que ele o seja, não que o me ofereça... tal e qual tu fazias. 
Vivo numa incerteza, vivo com o não saber se vou encontrar o que me oferecias num outro alguém e com a impossibilidade de entender o que guardas daquilo que fomos.
Gostava-te de te poder ouvir falar de mim, entender que pedaços meus ficaram no presente que não partilhamos.
Eu guardo carinho como devia ter feito logo no inicio quando só sentia raiva pela tua desistência.
Não te quero de volta.
Quero-te dizer que me estou a apaixonar de novo e que desta vez é a serio.
Falo com ele sobre tudo aquilo que fomos e que mesmo que eu não o consiga ama-lo como te amei, eu irei tentar não desistir só porque o passado me atrapalha.
Ele diz-me que vai fazer com que deixe de ter duvidas de que vou amar com a intensidade que amei.
Mas eu não quero amar.
Tenho medo do adeus que um dia possa chegar porque sempre chega.
Tenho pânico do pouco controlo que tenho de mim mesma quando me apaixono.
"Não quero gostar mais de ti do que agora gosto" digo-lhe.
Ele sorri-me, olha-me nos olhos e entendo que tal sentimento não se controla.
Ando a fazer amor, a andar de mãos dadas, a mandar mensagens de bom dia e a adormecer em chamadas pela noite fora.
O nosso adeus foi tão rápido.
Num dia tu amavas-me e no outro tinhas desistido de mim.
E o mesmo aconteceu comigo.
Um dia amava-te para sempre e no outro estava a receber beijos na testa.
De todos os pequenos amores que tive depois de ti este é diferente.
Não o uso para te apagar em mim.
Vivo com a certeza que nunca te vou esquecer mas que isso não é amar.
Tenho-te para sempre cravado na pele que ele toca, lembro-me de nós naquele dia do calendário e comparo beijos de língua mas meu amor, eu já não te quero a ti.
Quero estar a segurar um futuro e não passar a minha vida a segurar-te quando o que tenho de fazer é deixar de viver o presente por já não estares aqui.
Poderia desejar-te aqui mas estaria a perder tempo e a perder felicidade.
Desejo-o aqui, a juntar os pedaços que deixaste espalhados pelo chão do quarto.
Sinto-me tão bonita ao lado dele, meu amor. Perdi a beleza toda para ti naqueles dias onde chorava ao teu colo por me teres deixado. Culpa minha e tua.
Danço nua no quarto e ele focado a olhar para mim, sorri. Sou capaz de ter o mundo nas mãos naquele momento.
Sorrio no final de um beijo ofegante. Meu amor, já não sou só assim para ti.
Não suportava um amor falhado e tu não querias o sucesso da nossa junção.
Ele sabe que te escrevo e beija-me o pescoço. Dá-me tempo quando nem isso lhe peço, oferece-me a tranquilidade de reciprocidade quando não tenho certezas dos sentimentos que alimento.
Tenho a certeza absoluta que te amei e pouco mais que isso.
E ele espera que eu te acabe de escrever e que por estas letras, pelo suor que na cama criamos e pelas juras de amor que ele me sussurra que eu me permita amar de novo.
Mais do que a impossibilidade da existência do nosso amor foi o que fizeste a todos os outros. Matas-te as possíveis histórias que poderia criar com outros corpos apenas porque desististe quando eu estava a meio.
Mas desta vez, meu amor
Vou amar outro alguém.
Vou dar essa oportunidade a mim mesma.
A esta pessoa que sou sem ti há meses.

-mm


sábado, 19 de dezembro de 2015

Virgindade


Estou mal com o meu pai.
E contigo também.
O meu pai explicou-me a importância do sexo.
Tu tiraste toda a sua importância.
O meu pai explicou-me os métodos contracetivos mais eficazes sem tabus mas quando tinha o coração partido por ti não me conseguiu oferecer nenhum método suficientemente bom para me acalmar.
Acho que a virgindade está superestimada.
Amei-te tanto antes de saber o teu corpo e ninguém me avisou dessa possibilidade.
O meu pai ficava preocupado nas noites que ia dormir contigo e nunca entendeu que as mais perigosas eram aquelas que passava ao telemóvel contigo a chorar para no final te desculpar.
Sempre me disseram para esperar antes de ter sexo com alguém.
Desde miúda que me dizem que o meu corpo nu deve pertencer a alguém que me ame muito e que eu ame também.
Nunca me contaram o perigo de me entregar de alma e de coração sem pensar.
Jamais me ensinaram que mais do que a lembrança da primeira noite a fazer amor existem todas as outras que ficam para a vida.
Todas as marcas no meu pescoço já desapareceram e todos arranhões nas tuas costas já não existem mas continuo com infinitos pedaços do meu coração ainda para juntar.
No corpo feminino entende-se quando alguém já não é virgem mas ninguém me avisou que eu ia passar dias a demostrar o quanto tinha sido marcada por um amor antigo.
Com o sexo marcaste o meu corpo de forma visível apenas para quem eu permita me ver nua mas a nível psicológico tatuaste o teu nome para todo o mundo ver.
Ao meu redor entendem que já amei demasiado quando não acredito num outro alguém que entra na minha vida, quando me sento num canto a escrever sobre corações partidos e olho para as estrelas a pedir não amar da mesma maneira como te amei.
Já beijei bocas desconhecidas e continuo viva sem marcas duradoras. Já mostrei o meu corpo para um alguém que não amava e isso pouco me dói.
Tinha livros em casa que me demostravam com imagens a importância do sexo e da escolha da primeira vez. Os meus pais fizeram com que eu lesse cada um deles mas nunca me mostraram um poema de Florbela Espanca e do quanto um amor arranha as paredes do nosso psicológico.
Estou mal contigo porque me marcaste para sempre e não falo a nível sexual.
Estou mal com o meu pai por não me ter dado conselhos e métodos para sobreviver a um primeiro amor.

-mm





sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Miúdos apaixonados


Era uma miúda quando me conheceste e foi logo aí que me quebraste. Deixaste-me em pedaços antes de eu ter idade suficiente para ser inteira.
Lembro-me de dizer ao meu pai que os rapazes não estavam no topo da minha lista e que não queria preocupações acrescidas até te conhecer num acaso que me marcou a vida.
Não tinha idade para perder a virgindade mas já tinha provado o amor em mais de diversas situações, apenas contigo obviamente. O problema do primeiro amor é que ele consegue-nos marcar sem o corpo e mesmo que outro alguém nos dispa numa cama qualquer parece sempre que não é demasiado.
Tu foste o cúmulo de tudo, foste a demasia e a falta, foste o tudo antes de nós sermos crescidos o suficiente para termos algo.
Um amor como o nosso não devia ser oferecido assim. Éramos tão inocentes que acreditávamos que o para sempre era apenas a decisão do destino e não de nós mesmos, aliás quando terminámos a nossa relação ouvi-te dizer "se o futuro estiver connosco eu volto" mas o que é o tempo se nós desistirmos?

Demos o primeiro beijo juntos. Andámos pela primeira vez de mão dadas juntos. Vi-te a passar de ano, vi a tua barba a crescer enquanto ao mesmo tempo tu vias-me a começar a usar maquilhagem, a tomar a pílula e a ser mais mulher. Crescemos juntos e se há algo que tenho mais orgulho foi de te ter amado em todos esses momentos mas não era possível manter isso para sempre... éramos dois miúdos com um sentimento de valor abismal.
Tornamo-nos adolescentes que fumavam e saíam e mesmo assim íamos juntos. Tínhamos crises que ultrapassávamos. Estava lá no teu primeiro cigarro e no teu primeiro copo de álcool e tu estavas lá na primeira vez que estava tão embebida em álcool que nem conseguia andar. Íamos tomando os nossos caminhos sem notarmos. Eu achava que o para sempre teria o nosso nome e que seríamos o primeiro casal de todos a alcançá-lo. A tua cara começou a ter alguma borbulhas. O meu armário começou a estar repleto de roupa que não me servia e com tantas mudanças começaram as nossas primeiras discussões. Não eram apenas as minhas calças preferidas que não se ajustavam a mim mas tu também.
Crises de adolescência. Que não ultrapássamos juntos. Não sei quem culpar, se tu ou eu ou ambos pela nossa inocência e juventude. Achei que tu voltarias sempre e sei que tanto como eu, tu achavas o mesmo. A tua despedida foi como um "eu vou mas já volto" mas nunca voltaste, estavas e estás a provar uma vida que não tinhas a meu lado e tu gostas desse sabor. Errei por acreditar que não haveria nada que se equivalesse a tudo o que passavas a meu lado.
No dia que coloquei aparelho disse-te "espero que estejas a meu lado quando o tirar" e dois anos depois estava perto da recepção do dentista a mandar-te por mensagem uma fotografia minha com os dentes direitos. "Estás linda e eu continuo aqui!" disseste, "amo-te" disse-te. Os meses passaram desde esse dia e eu, que já não me lembro da sensação de ter aparelho já não te tenho ao meu lado.
Muitas pessoas dizem que ninguém deve viver um grande amor na adolescência, eu concordo devido a todas as lágrimas que a minha mãe segurou e todas as noites que chorei até que me lembro das nossas noites na praia, da sensação do meu primeiro beijo debaixo de água e de toda a leveza que todos os nossos momentos tiveram.
Num almoço qualquer a minha irmã disse-me que não devia voltar para ti com facilidade mas eu nem dezassete anos tinha e a minha irmã nunca soube que me deu esse aviso no dia a seguir a uma das vezes que terminámos depois de uma tentativa falhada. Depois do final da nossa relação de putos quase que me senti uma viúva, tinha perdido o amor da minha vida demasiado cedo. Não me interessava ter a vida pela frente se te ia perder o rasto, se não ia ver-te a ir para a universidade como planeado, se não íamos continuar a ir ver todos os anos aquele saga de filme.
Tinha quinze anos quando me apaixonei por ti. Lembro-me de a minha família perguntar pelo "namoradinho" e eu dizer que não tinha e não tinha, eras o amor da minha existência. Parecia que ninguém tinha tido o primeiro amor quando o diminuíam a uma palavra tão ridícula.

Atualmente desisti de acompanhar o teu crescimento e tu o meu, teríamos de aceitar a entrada de outras pessoas e prefiro não te ter do que partilhar o teu álbum de fotografias desde puto até agora com um outro alguém que só te conheceu no final da tua adolescência.

-mm




 

Para ti, que já não te amo


Estragar o amor depois de estragado.
Foste embora por medo de perderes-me.
Ficámos sem nada na tentativa de manter tudo.
Pedir desculpa antes de cometer um erro e errar por isso mesmo.
Temos amores alternativos por não ser possível voltarmos ao que tínhamos seja por minha culpa ou por tua. Gravava-te para sempre em mim nas tentativas de te largar enquanto que tu me ias perdendo inconscientemente nas tentativas para ficares.
Contigo descobri o amor e a falta dele, no seu conjunto ou para mim mesma.
Aprendi as melhores lições em exemplos que magoavam. Ensinaste-me a viver para ti e deixaste-me sem escolha numa vida sem ti.
No final de tudo fui boa para todos menos para mim própria, calava a boca dos que me queriam com beijos que queria oferecer-te.
Ficávamos ofendidos com a possibilidade de haver uma aceitação de um amor de outro alguém. Aceitavas o meu corpo nu com outro sem roupa mas não conseguias manter a postura se dissesse que amava outro alguém. E para a tua felicidade e infelicidade minha, não houve nem uma migalha de sentimento oferecida de mim a outro ser. Não falamos. Acho que com a quantidade de tempo que passou já não me lembro do timbre da tua voz ou de certas feições da tua cara. Não me lembro de como beijas e se me oferecessem a possibilidade de sentir de novo eu viraria a cara.
Estamos com a história encaixada num passado tão longínquo quanto parecia que a nossa relação viria a ser. Digo que já não te amo. E não amo. Hoje não tenho nem uma pequena vontade de trocar palavras contigo ou de trocar qualquer gesto. O teu corpo não me pertence e o meu já não é teu.
De tudo o que já passámos, hoje não passamos de um nada que foi tudo. Amei-te como nunca amei alguém e sei que ainda não amas alguém da maneira como me amaste.
Fomos o primeiro amor um do outro e partimos todos os pedaços que haviam. Gastámos a ingenuidade. Perdemos a pureza e no final de tudo deixamo-nos um ao outro. Procuro algo que nunca encontrei em ti, seja a realidade de amores temporários ou a facilidade de desistência que nem tive depois da mesma acontecer.
Agarrei um peso morto durante muito tempo para ter força para carregar alguma relação por mais pequena que seja. Quero liberdade mesmo que nunca me tenha sentido presa a ti. Vejo-te a voar como me disseste que ias fazer, sei que vais conhecendo diferentes corpos no teu quarto e o meu corpo abraça também outros alguém. Não há amor, seja da minha ou da tua parte mas sim a necessidade de conhecer o que nos proibimos de fazer quando estávamos juntos. Havia exclusividade e de tão exclusivo houve uma necessidade de ir embora.
Perdi-te no dia que te estava a tentar não perder-te. Tinha as mãos frias como sempre e tu estavas ao meu lado a chorar. Haviam lágrimas que gritavam "amo-te muito" espalhadas na cama onde tínhamos dormidos juntos na semana anterior. Os teus olhos sabiam a culpa que carregavas e os meus a impossibilidade de mudar a tua desistência.
Perdemos o amor de uma vida numa quarta feira à tarde num sofá velho. Lembro-me de ver o mundo a chorar à minha volta enquanto eu ignorava o facto de estares a ir embora. No dia seguinte, apercebi-me que não estavas lá e aí entendi que o mundo não iria parar a não ser para mim mesma.
Passei meses numa busca insaciável de algo que soubesse ao mesmo que tu me sabias. Meses sem conquistas, dias de luto e noites de cansaço. O teu sabor está apenas na tua saliva e nas tuas palavras e não valeria a pena pagar qualquer garrafa que fosse que eu no final da noite, com a maquilhagem borrada e de mão dada com outro alguém dizia às estrelas que nunca te ia esquecer. E de facto não vou e nem tu a mim. Fomos o amor da vida um do outro quando a nossa existência tinha circunstâncias complemente diferentes. Ainda não sei quantas vezes vou viver desde que nasci mas já sei que gastei uma vida contigo. Nasci no dia que me apaixonei e morri no dia que não te quis de volta pois se a pessoa que eu era ainda fosse viva prometo-te que te estaria a escrever um pedido para voltares. E esta, a pessoa que neste está a juntar estas palavras só te quer dar a notícia que estarás para sempre num lugar em mim, mesmo que uns dias te odeie mais do que alguma vez ache que amei.
Não te desejo ver mais ou ouvir a tua voz ou sentir o teu perfume, quero guardar de ti uma memória parada no tempo, uma memória de nós felizes a tirarmos fotografias em espaços que só se tornavam aceitáveis por haver tanto sentimento em comum.

-mm


 

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Dois corpos e uns lençóis quaisquer


Fazes-me sentir sexy num daqueles vestidos brancos de praia e enquanto estou nua em cima de ti ou deitada na cama que partilhamos.
Não existe um pedaço de pele que não deseje mostrar-te.
A roupa está no chão e o passado também.
As luzes estão acesas, não há vergonhas ou pudor.
Corpos nus e mãos esfomeadas.
Línguas que se tocam e lábios que se conhecem há uns minutos que parecem uma vida.
A virgindade perdeu-se no momento que soube o teu nome e o ego aumentou quando me sussurraste no meu ouvido o meu.
A ingenuidade deixou de querer partilhar o quarto connosco.
O silêncio é cortado com a nossa respiração.
Sou capaz de voar ou de percorrer o mundo todo quando te noto paralisado em mim.
Tens o meu corpo e o meu primeiro nome, o resto o tempo irá trazer-nos seja lá o que ele seja para além de noites onde partilhámos orgasmos.
Despeço-me com um beijo na boca e parece que te amo muito sem amar.
A minha nudez acaba apenas quando visto a tua camisa na varanda e partilhamos cigarros.
A noite parece sempre curta para a quantidade de milímetros que a minha pele quer conhecer da tua.
Os nossos corpos unem-se e apaixonam-se enquanto psicologicamente andamos numa procura de respostas.
Não há paixão, amor ou relação.
Há uma cama e uma noite que partilhamos e com o tempo encontramos mais tempo e mais quartos para no final termos sempre dois corpos e uns lençóis quaisquer.

-mm


sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Um gelado e um mapa


Perdida de ti e de mim.
Agora estou parada e vejo todos à minha volta a andarem em correria como fossem encontrar o amor da vida delas.
Estão tão perdidas quanto eu mas fingem que sabem o caminho que levam mas sem mapa ninguém chega a lado nenhum.
Cansei-me.
Percorri demasiadas ruas para te encontrar e não te vi.
Haviam perfumes parecidos, rostos e corpos idênticos mas nunca conseguiam ser o que foste.
Estou sentada no jardim onde nos beijámos pela primeira vez, a olhar para o lugar onde disseste que me amavas.
Também te amo ainda.
Nem imaginas a quantidade de homens me questionaram se se podiam sentar. Disse que o lugar estava ocupado, que tinhas ido comprar um gelado e que já voltavas.
Não sei que gelado foste buscar mas aqui continuo na esperança que não hajam sabores que gostes na gelataria.
Já é quase de noite.
Não tenho mapa, gelados ou a ti.
Perdi-te e não sei como voltar a encontrar-te.
E encontrar-me.
Dá-me uma pista ou então diz-me que foste comprar gelado com alguém.
Eu vou continuar aqui, neste verde velho banco... pode ser que apareças tu ou alguém com um mapa e um gelado e me diga que quer se perder e engordar comigo.
Vou continuar aqui a amar-te até te esquecer.

-mm


quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

O dia que te esqueci


No dia que te esqueci comi cereais com leite, vesti umas calças justas e uma camisola larga (eu sei que é na nada de especial mas está na moda).
No dia que te esqueci escovei os dentes e não senti a falta da tua escova naquele copo que comprei a cinco euros no Ikea e mal tu sabes o choro que era todas as manhãs deparar-me com o vazio das tuas coisas. Chorava e borrava os olhos, bem tu me dizias que devia deixar de encomendar maquilhagem daquela revista que a melhor amiga da minha mãe tem mas seria um desgosto que não lhe quero provocar.
No dia que te esqueci reclamei com o cabrão do vizinho de baixo que agora tem a mania que a namorada pode estacionar no teu lugar. Preferia quando ele namorava meninas do liceu que nem carta têm mas acho que os seus quarenta já lhe estão a trazer a perceção que elas têm idade para ser suas filhas. Ia sempre a pensar em ti até chegar ao escritório, no quanto nos íamos rir destas situações hilárias devido aos vizinhos em crise de meia idade mas no dia que te esqueci nem me recordei que podias rir comigo.
No dia que te esqueci almocei com a Joana, está gravida de seis meses (ela que sempre nos dizia que não gostava de crianças), comi salada e bebi um Compal de pêra num daqueles restaurantes onde o preço é maior que a qualidade mas enfim, tinha sido escolha dela. Se tivesses lá, pedias um bife com batatas fritas e uma água (numa tentativa de ser saudável falhada) e quase de certeza que estarias a resmungar com a vida por não sermos o primeiro casal do grupo de amigos a ter uma criança a chorar pela casa mas tu não estavas e eu nem reparei na tua ausência.
No dia que te esqueci só fumei um cigarro até chegar a casa pois foi um dia ocupado e eu fumava mais quando tinha saudades tuas. Fumei um cigarro daquele maço que está no móvel da sala quando não temos cigarros e não nos apetece sair de casa para ir comprar mais. Acendi-o enquanto via o mar, sentei-me no banco onde passávamos noites a beber vinho branco e a planear o futuro. Se não te tivesse esquecido nesse dia talvez me torturasse com as memórias tuas que habitam na casa mas ela foi um negócio demasiado bom para eu sequer colocar em questão deixar as recordações estragarem o investimento.
No dia que te esqueci tive de sair de casa de fato de treino para ir comprar comida para a gata e o para bem dos meus azares, o supermercado já estava a fechar quando lá cheguei, ainda bem que o homem da caixa era um defensor de animais e não um trabalhor desmotivado e contra horas extras. Nunca gostei de gatos mas tu disseste que não irias ter tempo para a Estrelinha - que raio de nome piroso tu lhe deste - e eu que a carregue, a ela e ao seu nome que até me custa a dizer quando alguém novo vem cá a casa. No dia que te esqueci, eu que não gosto de gatos gostava mais da minha Estrelinha do que de ti.
No dia que te esqueci liguei o aquecedor da sala, acendi a televisão que sempre achei que era exageradamente grande e vi um daqueles típicos episódios de uma série policial... é verdade, eu que sempre te pedia para mudares de canal acabei rendida aos polícias americanos mas tens de concordar comigo que é obvio desde o inicio quem é o culpado. Adormeci no sofá e tu não estavas à minha espera na cama, no dia que te esqueci soube-me melhor dormir sozinha do que de qualquer das vezes que dormi contigo.
 Na verdade, no dia que te esqueci, não sei que roupa vestia, qual foi o meu pequeno almoço, se o cabrão do vizinho tinha uma namorada com a idade certa ou qualquer outro detalhe pois o dia que te esqueci não tem data definida. Apercebi-me que te esqueci quando dei por mim sem me lembrar de ti há dias seguidos.
No dia que te esqueci foi o dia que comecei a lembrar-me de mim.

-mm


Matemática dele


Nunca gostei de ti.
Usei-te para tapar os buracos que ele criou.
Usei-te e a mais uns quantos, já perdi a conta.
Nunca fui boa a matemática
Ele sabe disso.
No meio dos ramos de flores, tinha sempre pilhas para a calculadora.
Até aquele dia que ele chegou sem ramo.
Era apenas uma flor, não havia contas para fazer.
"Assim não tens de te preocupar com cálculos"
Sorriu-me e disse que ia ensinar matemática
"Precisas de quantas aulas para voltares para mim?", disse-me que não sabia.
"Como é que podes ser professor se nem sabes o número de horas que vais estar numa escola?"
Nunca me respondeu, pediu a calculadora e lá foi ele.
Acenou ao longe enquanto pedia desculpas, na mão tinha uma pasta e livros.
Eu fiquei com as pilhas gastas e com um amor subtraído.
Até chegares tu e outros corpos que se deitam na minha cama.
"Qual é a tua disciplina preferida?"
"Matemática"
"És boas em equações?"
"Mais ou menos" minto.
E assim ficas um tempo a quebrar o silêncio da casa sem ele.
Trazes-me pilhas no meio de tulipas mas tu esqueces-te sempre que eu já não tenho calculadora.
Ele levou tudo.
Deixou-me aqui com papeis de cálculos que ele escreveu.
Eu não entendo as revoluções mas tenho saudades.
Dizes-me que sabes contar até cem.
Digo-te que ele sabia contar até mil.
E no meio de somas, multiplicações e substrações digo-te para ires.
És um resultado inconclusivo, as tuas comparações fazem com que me lembre mais dele do que quando estava sozinha.
Leva os teus cem números e as pilhas.
Eu fico bem aqui a contar com os dedos na esperança que ele me traga de volta a calculadora.
Nunca te amei.
A ti ou aos teus algoritmos por isso vai.
Eu só gosto da matemática dele.

-mm


quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Estavas tão linda


Estavas tão linda com aquele vestidinho branco quase transparente. Por centímetros que não te vi as coxas, imagino que serão macias e sem um único pêlo. Se a perfeição não existe então não devias existir no corredor perto da sala das fotocópias onde as mulheres falam do marido que as trai mas que continuam com ele porque são muitos anos e porque o Francisco Maria está numa má da fase da adolescência. Tu não lhes dás conversa, ainda nem pensaste em casamento quanto mais em ter filhos numa fase complicada. Gosto da tua juventude. Posso ser jovem contigo em plenos trinta e muitos?
Todos os dias te vejo à espera que resmas de papeis brancos passem a ter tinta e o mundo pára. Na segunda-feira irritei-me com o Sr. João que troca os tinteiros para que o pessoal do escritório não tenha essa tarefa e não estrague a impressora outra vez, ele perguntou-te como o teu dia estava a correr e olhava-te para as mãos, nunca vi mãos tão perfeitas. Tens os dedos compridos, unhas saudáveis e os pulsos pequenos, nem tu imaginas a quantidade de vezes imaginei as tuas unhas e os teus perfeitos dedos na minha pele. Estavas tão linda quando respondeste ao Sr. João que estava tudo bem com a tua vida. Com a minha também estaria se tu estivesses aqui.
Odeias os copos de plástico que o patrão nos faz usar para não haver pedaços de vidro espalhados devido a incidentes de percurso e eu gosto da tua cara de irritada quando a tua mão escalda e o açúcar vem a pacotes com frases pirosas. Não és mulher de ordenado mínimo nem que aceita aquelas "colheres" de plástico que vêm em pacotinhos de papel. Tenho a certeza que também não és do género de mulher que se deita e acorda com quem não ama, então eu espero que um dia repares em mim por detrás daquele portátil que me faz companhia dias e dias de seguida. Estavas tão linda aborrecida com o teu café de hoje que preferia ser um daqueles grãos triturados com água do que o homem por quem passas e não reparas.
Estavas tão linda hoje com o teu sorriso matinal que eu odeio porque não consigo sorrir antes do meio dia e meia como tu; com o teu cabelo pelos ombros e bem cuidado a cheirar a flores e mesmo que tu sejas como todas e compres o teu shampoo no supermercado mas ele tem outro efeito em ti; com o teu fio que roça no pescoço tão inocentemente mas que me faz deixar toda a inocência de lado.
Hoje faltei ao trabalho, estou doente e em casa na esperança que notes a minha falta, eu sinto a tua cá em casa e tu nunca aqui tiveste. Hoje estavas tão bonita, eu sei e nem te vi.

-mm




A nossa zona de restauração


Lembro-me de nós, parados no tempo e na vida a ver os velhos focados nas entrevistas de futebol, a mulher que carrega mais sacos de compras do que lucidez para entender que não tem dinheiro para tanto, a criança que chorava por querer um chocolate e a mãe que explicava-lhe o quanto os vícios matam as pessoas aos poucos enquanto comprava um daqueles novos maços de Malboro com vinte e cinco cigarros.
Ficávamos hora a imaginar o diálogo das pessoas que se sentavam nas mesas à nossa frente, fazias a voz dos homens e eu das mulheres e o tempo passava por nós como um pássaro louco que não tem medo do inverno que possa chegar. Nós não tínhamos medo do futuro que íamos ter e no centro comercial, perto da loja das saladas, de mãos dadas riamos para o mundo de tão apaixonados que estávamos.
Havia um casal de velhinhos, ela andava sempre de casaco e pedia sempre um chá no café até ele fechar - mas que raio de zona de restauração não tem uma bica e torradas quentes com manteiga cheia de sal? A nossa. Mas nada disso importava se sempre que nos sentávamos na mesa habitual o mundo parecia calar-se - dizias-me sempre que íamos ser assim só que tu não irias perder tanto cabelo e eu não ia engordar tanto. Sorria. Querias-me para sempre como eu te queria. Não há melhor sentimento do mundo que aquele que é recíproco.
As senhoras da terceira mesa perto das escadas rolantes sorriam-nos todas as sextas -feiras em que cansados da semana de escola pedíamos uma coca-cola e a dividíamos, nunca te disse mas acredito que elas nos olhavam e lembravam-se daquele amor que tiveram na adolescência e que nunca esqueceram, também nunca te disse que preferia beber ice-tea mas tu gostavas tanto do gás da bebida que partilhávamos que eu não me importava de esquecer o que gostava para te ver tão genuinamente feliz.
É impossível contar o número de tardes que gastámos a observar faces que nunca mais vimos na vida. Espero que todas elas estejam bem e que tu também. Hoje há outro casal a ocupar uma mesa perto daquela onde nos sentávamos, eles não entendem porque baixo sempre os olhos quando passo no local onde fomos felizes e mal eles sabem o quanto eu já fui feliz contigo. As senhoras da terceira mesa no outro dia chamaram-me e contaram-me a história delas, devias ter conhecido a Matilde... com os seus oitenta anos, magra, de pérolas e com rugas bonitas, diz que continua apaixonada e que o marido não perdeu o cabelo. Lembrei-me de ti, de quando dizias que íamos ser assim mas nem uma ruga ainda tenho e tu já aqui não estás.
Que raio de zona de zona de restauração não tem uma bica e torradas quentes com manteiga cheia de sal e não nos tem a nós?
-Tem livro de reclamações?
-Sim mas o que quer reclamar?
-Falta café, pão, manteiga e um amor para sempre.

-mm Maria Cunha e Silva


terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Uma merda como ex


Fui uma ótima namorada.
Uma merda como ex.
Quando escolhemos namorar com alguém pensamos na eternidade de um amor mas a única que teremos é a eternidade da falta do mesmo.
Vou ter os meus ex´s para sempre enquanto os atuais vão ter o seu tempo contado.
E eu fui uma merda nesta eternidade que sou. Aquela que já amaste muito mas já não amas.
Gritava-te aos ouvidos o quanto não prestavas por reagires tão bem a toda a situação de não nos pertencermos. De não te pertencer. De não me pertenceres.
Foste um ótimo namorado até seres uma merda por quereres ser ex.
Foste um ótimo ex.
Para quem já não sente nada os rótulos pouco interessam e toda a distância não magoa. A mim magoava pois eu ainda sentia.
Ser solteira era fácil se não amasse ainda.
Onde errei? Questionava-me
E tu sem respostas remetias a oferecer-me silêncio.
"Não me ofereças essa merda" dizia-te de olhos molhados.
"Não sejas esta merda"
"Não fomos uma merda então porque é que desististe?"
E assim, sem reparar desgastava a tua vontade de continuar qualquer ligação para comigo.
Fui uma merda de ex quando tudo o que queria ser era a atual.
Via em todos os teus movimentos um apagão do que tínhamos sido.
Já nem sabia se alguma vez tinhas realmente estado apaixonado.
O amor tornou-se em obsessão,
eu cansava-me
cansava quem estava à minha volta
e tu cansavas-te de mim.
Amar muito era o meu problema e o teu amar pouco tornou-se no sentimento perfeito.
"Quem errou foste tu, porque tenho eu de ser o erro por querer lutar por algo tão grande que tínhamos?" e mesmo conjugando os verbos no passado eu continuava a querer-te no presente.
Era uma merda que me tornava numa merda.
Hoje, com o tempo que passou não sou nada.
Para ti ou para a nossa história.
Fui uma merda porque te amava muito e agora que não te amo não sou nada mais.
Não te peço desculpas e nem sei se tu as aceitavas.
Eu não aceito as tuas.
Se tiveste o melhor de mim, obvio que carregarias o pior de mim depois de um final sem sentido.
Fui uma merda até para mim própria e se existe alguém a quem tenho de pedir desculpa é a mim mesma por ter perdido dias e meses a ser algo para alguém que não queria nada.
Foi uma merda amar-te e por isso é que fui uma merda.
Mas não esqueceremos também que foste tu que começou tudo.
Fui uma merda por teres sido uma.

-mm







Fomos uma merda um para o outro


Destruímos tudo.
Tu culpavas-me e eu culpava-te.
A culpa não era de ninguém a não ser do tempo que passou por nós.
E que levou-nos para cantos opostos. Na vida e no mundo.
Fomos uma merda um para o outro.
Eu porque te amava tanto.
Tu porque me amavas tão pouco.
Culpavas-me devido ao que sentia.
Culpava-te devido ao que não sentias.
Quando ambos sabíamos que não escolhemos sentir o que sentimos.
A única forma de matar a tua culpa de teres ido era colocar todos os meus defeitos à vista e esconder todas as minhas qualidades e a única maneira de deixar de sentir algo por ti era começar a odiar-te devido ao facto de não me olhares com os mesmos olhos.
Fomos pelo caminho mais fácil. O do ódio.
Trocámos um sentimento pelo outro.
Como é que poderia amar-te se te odiava por me odiares tanto já que eu te amava tanto?
Trocámos o vazio da cama por um molho de corpos sem nome.
Trocámos os perfumes,
Os objetivos,
Os desejos,
Trocámos a vida e
Destruímos tudo.
Fomos uma merda um para o outro.
Por razões estupidas e pela imaturidade que tínhamos.
Partimos o coração um do outro e gastámos tudo o que havia para gastar.
Tirámos o máximo proveito de tudo, até das despedidas.
Tu nunca choraste, começaste a gastar mais gasolina, a ligar-me em noites complicadas, a dar passeios de mão dadas com outras miúdas e usar descaradamente as roupas que te ofereci para ires sair a noite com raparigas vazias.
Eu chorei muito, comecei a gastar mais tinta, a ir para a cama da minha mãe em noites complicadas, a dar passeios sozinha e a usar roupas que nunca vesti contigo para não lidar com as saudades que podiam chegar.
Hoje não sei onde andas e ainda bem.
Percorro estradas onde nunca andámos e estou com um sorriso na cara.
Desejo-te o melhor mesmo que te tenha destruído de um certo modo.
Não peço desculpas por nada e nem aceito as tuas.
Não quero ouvir a tua voz ou ver-te alguma vez mais.
Foste o que tinhas de ser numa altura da minha vida.
Foste uma época boa mas que não repetia.
Às vezes lembro-me de ti e, como sempre, culpo-te.
Foste uma merda para mim e eu fui uma merda para ti.
Não sabemos lidar um com outro a não ser que haja um sentimento mútuo.
E agora que ambos não sentimos nada continuamos com a impossibilidade de termos algo pois destruímos tudo.
Fomos até uma merda para nós mesmos.
Eu que me tranquei em casa dias seguidos a suplicar amor como se necessitasse dele para sobreviver.
Tu que perdeste tudo.
Já não te amo.
E nem tu a mim.
Mesmo assim espero que sejas feliz da maneira que eu era quando estava contigo.
E da maneira como sou agora sem ti.
E no meu intimo de mulher, desejo que tenhas noites de saudades minhas.
Só para te destruir mais um bocadinho e ser uma merda para ti.
Só para me odiares mais do que odeias.
Adeus.

-mm


Desculpa, eu não sabia


Peço desculpa mas não sabia que estava apaixonada por ti. Beijava-te de olhos fechados, mãos nos teus cabelos e de sorriso no rosto "parabéns Maria estás a ser uma boa atriz" repetia no meu caminho para casa depois de ter passado uma tarde inteira contigo... mal eu sabia que estava a mentir a mim mesma para não admitir um sentimento que existia dentro de mim.
Sabias-me tão bem e eu não me lembrava que o amor podia ser assim, leve e doce. Trocávamos poucas palavras e muitos beijos, poucas discussões e muitos sorrisos, poucos "gosto de ti" e muitos passeios em locais onde ninguém nos conhecia. Quando saíamos do meu quarto visitávamos recantos da cidade onde fosse impossível alguém nos ver, "não me dês a mão" e tu continhas-te, "não nos podemos beijar que ainda alguém nos vê" e tu calavas-te e aguentavas os meus pedidos. Nunca te agradeci e se ainda for a tempo, obrigada por isso e por inconscientemente teres curados todas as minhas feridas que estavam abertas quando te conheci.
Estávamos ambos quebrados e a nossa junção era apenas mais uma tentativa nossa para tentar colar de novo todos os estragos que o passado começou. Nunca te contei o quanto já tinha amado antes e tu, tanto como eu, remeteste-te ao silêncio. Vivíamos o presente sem pensar no que já tinha acontecido connosco antes... nunca soubeste em quantas camas me deitei antes de chegar à tua e eu nunca soube porque razão decidiste pousar mais tempo nos meus braços em vez de todos aqueles que tinhas à tua disposição.
"Estamos juntos mas não te amo" "também não te amo" e ambos sorriamos pois se não havia sentimento não poderia haver possibilidade de nos magoarmos como antes tínhamos sido. "Deixo-te escolher o filme mas sei que não me amas" e eu sorria-te como se o mundo parasse por tu não me amares também. Não chegámos a ser algo mas não fomos nada e hoje com o peso do tempo que passou consigo ver que não te dei a oportunidade que devia devido ao quanto quebrada estava e tu de tão quebrado que já tinhas estado não querias unir os meus cacos com medo que eu te deixasse tão partido como já te tinham deixado.
Estou inteira pois de um certo modo conseguiste ensinar-me a curar todos aqueles arranhões que marcavam a minha pele e agora que já não sou pedaços como antes era, quando te segurava na cara e te beijava a bochecha devagar. Lembro-me de os meus olhos brilharem quando recebia uma mensagem rápida que dizia "estou a ir ter contigo", se viesses no final do dia eu já era feliz desde manhã mas inventava desculpas a mim mesma para conseguir acreditar que não estava apaixonada por ti.
Lembro-me de uma vez no silêncio da noite e no silêncio do quarto sentir a tua mão na minha barriga enquanto que eu de olhos fechados ouvia apenas a tua respiração, calma e constante... desculpa se nunca percebi que te amava da mesma forma. Recordo-me também de te olhar de longe e admirar-te, desculpa se nunca te o disse. Eu não sabia que estava apaixonada por ti.
Um dia decidiste ir embora e eu sorri, nem uma lágrima caiu na minha cara. "Não te amo por isso podes ir" disse-te. Era amor e eu não sabia. Era mais do que foi e eu não me apercebi. Desculpa.
Desculpa mas eu não sabia que estava apaixonada por ti pois o medo de sentir tal coisa era maior do que o sentimento que havia. Hoje não me resta dor nenhuma ou medo algum e por isso escrevo-te na esperança que me digas "desculpa por ter ido embora".
Eu desculpo.
Tu desculpas-me?
É que eu não sabia que te amava.

-mm

 




segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Ela


Ela estava quebrada e juntou todos os pedaços para que a teu lado pudesse ser suficiente. Os cacos estavam colados e ao teu colo pareciam indestrutiveis a qualquer vento que o destino trouxesse e ela sorria por todas as feridas estarem saradas, todas lagrimas secas e todos os pesadelos acabados até ao dia que partiste e o vento partiu em inúmeros pedaços quem ela era. Eras a cola.
Ela sempre tinha sido a criança estranha que lia livros no recreio, que escrevia em papeis soltos poesia, que não gostava de nenhum menino porque queria um amor a sério. Tu sempre tinhas sido a criança feliz e boa no desporto, de joelhos esfolados, que pintava fora das linhas e dava beijinhos atrás dos arbustos. Obvio que nunca dariam certos mas ela sempre tinha lido histórias de amor onde não se desistia à primeira e tu por não saberes o que era uma tinhas curiosidade de experimentar o que era amar alguém.
Ela era o sorriso em pessoa e mal tu sabias os oceanos que nasciam dentro dela devido a todas as lágrimas que não expulsava pois mostrava-te o melhor lado dela seja nas fotografias ou na vida com medo que deixasses de sentir o que sentias. Ela acreditava que não seria alguém sem a possibilidade da tua existência, da vossa existência e então quando decidiste ir embora, todos os oceanos que nasceram em segredo dentro dela tiveram a urgência de sair noites de seguida e ela chorou, chorou até não restar uma única gota salgada que quisesse vir ao mundo. Ela chorou por ti e por todas as vezes que não o fez devido a ti e ao medo de perder-te.
Ela era a miúda que pedia um beijo à mãe depois de uma discussão só porque não sabia o que era dormir com a dor de perder ou magoar alguém. Escrevia pequenos papeis e deixava-os pela casa só para que soubessem o amor que ela sentia, ela a ti não te escrevia mas vivia a tentar mostrar-te o sentimento que ela tinha por ti. Um dia ela deixou de espalhar frases pela casa e deixou de te dizer que amava porque tal como todos, ela acabaria por crescer mas continuaria a amar a mãe mesmo que não o escrevesse em papeis que colocava no frigorifico.
Ela gostava de andar descalça fosse no inverno ou no verão e não haveria meias ou chinelos que a fizessem mudar de ideias, "adoro sentir o chão frio" dizia mesmo que na semana a seguir passasse dias doente pois pequenos minutos de prazer valiam todas as consequências e ela era assim contigo "adoro a maneira como ele olha para mim" dizia mesmo que no ano a seguir passasse dias de coração partido pois, na sua opinião, pequenos minutos a ser amada por ti valiam todas as consequências.
Ela sempre vestia vestidos curtos, nunca secava o cabelo e dançava na frente do espelho e tu que sempre pensavas que miúdas que liam usavam óculos e calças... ficavas horas a olha-la sem maquilhagem. Ela mostrou-te um lado do mundo que nunca irias reparar, ela amava de corpo e alma. Faziam muito amor pois ela se era para dar-te algo oferecia tudo o que tinha, desde a pele a palavras quentes. Ela gostava de dormir contigo só para ter certezas que era mesmo como o amor que ela lia em todos aqueles livros que enchiam a mesa de cabeceira das camas onde vocês adormeciam nus.
Ela gostava de finais tristes, dizia-te que estava apaixonada por um filme ou por um romance porque o final era trágico, tu seguravas-lhe uma madeixa de cabelo e não entendias toda aquela melâncolia que carregava se na tua opinião tudo o que era bom teria de ter um final feliz mas mesmo assim ofereceste-lhe o que ela gostava de ler, um final triste. Ela agradeceu, deu-te um ultimo beijo inesquecível e deixou-te ir. Ela contou-te uma vez que recolhia caracóis, borboletas e todos os animais que encontrava no jardim até que um dia percebeu que se os amava tanto teria de os deixar ser livres, teria de deixa-los viver no seu habitat e mesmo que ela acreditasse que o teu habitat fosse nos braços dela, queria que tu descobrisses isso por ti próprio, então, como uma borboleta azul que ela encontrou quando tinha oito anos, disse-te para voares. E voaste.
Ela gostava de tomar banhos longos mesmo que o tempo fosse curto para todos os planos que ela teria nesse dia e assim, da mesma forma, ela beijar-te-ia. Ela poderia não ter tempo para se pentear como deve ser, para escolher meias da mesma cor ou para comer um bom pequeno almoço mas teria sempre tempo para ti a que horas fosse ou a qualquer momento do dia pois para além de tudo, tu estarias sempre em primeiro na lista de prioridades, até mesmo acima dela mesma e por isso tu também decidiste ir embora, o peso que fazias nela mesmo que não fosse tua culpa era demasiado por não ser retribuído e aí entendeste que amar não era uma escolha e que mesmo que a quisesses amar da mesma maneira que ela te amava, tu simplesmente não o sentias.
Ela escolhia sempre roupa à pressa, odiava compras e nunca pintava as unhas e no meio de uma multidão de miúdas iguais ela odiava que dissessem que ela era diferente, mal ela sabia que diferente era bom. O tempo levou-te para longe dela e agora vês-te em braços de raparigas que trocam de perfume todos os meses e que nem sabem a tua data de nascimento. Ela nunca mudava de perfume e isso iria fazer com que memórias vossas aparecessem em situações inoportunas que a vida viria a trazer. "Mudaste de perfume?" perguntavas a uma de muitas que viriam a entram na tua vida e sempre que te diziam que sim, esperavas ansiosamente por uma delas acertar no perfume dela mas nunca chegavam a tal escolha. Não é um perfume popular e no teu subconsciente agradecias por isso pois no fundo, não imaginarias uma pele diferente com um cheiro que te lembrava todas as vezes que amaste tão intensamente.
Ela inteira a teu lado, quebrada por dentro. Ela poeta, escritora e leitora assídua. Ela sorriso na cara sem maquilhagem. Ela cabelo despenteado e molhado. Ela roupa escolhida à pressa e pés descalços. Ela banhos de espuma. Ela unhas curtas sem cor. Ela perfume que não encontras em outro lugar. Ela que não encontras noutro lugar a não ser no passado que deixaste fugir. Ela.

-mm




Como sempre


Eu sei que um dia nos vamos encontrar no meio de uma multidão apressada, vais-me olhar de alto a baixo e com os teus olhos fixos nos meus irás dizer-me surpreendido "não esperava encontrar-te aqui" como me quisesses dizer que ainda vês a adolescente que era por detrás da maquilhagem, da mala cheia de objetos inúteis e dos saltos altos. De seguida irei sorrir para ti e sem pensar muito irei responder-te com um "olá, então como andas?" seco e rude para que entendas que a menina ingénua e fraca que deixaste tornou-se numa mulher forte e de sucesso.
 Nesse dia tudo irá parar a nossa volta como no momento do nosso primeiro beijo e por segundos cada centímetro da tua pele vai relembrar-me de todas as noites em claro e de todo o bem que me fizeste, as tuas mãos vão parecer que pedem as minhas e na verdade vão mesmo faze-lo mas os anos que nos vão separar vão ser mais do que a possibilidade ou desejo de nos termos um ao outro.
"Queres beber um café? Não sei nada sobre a tua vida" vais dizer-me com a voz calma enquanto a barba me vai fazer recordar do quanto amei o puto que se queixava das borbulhas que lhe atacavam a face. Aceito o teu café e pelo caminho, passo a passo ambos acabamos por entender que temos de nos conformar com a distância que criámos um do outro quando partimos os nossos corações. Vou contar-te pequenas coisas e o teu olhar vai quase parar em cada gesto meu ou a cada gargalhada que irei dar a contar os tempos que bebia em festas sem pensar nas consequências e no meio do meu discurso elaborado questionas a verdadeira razão de teres ido embora, perguntas subtilmente se tenho ideia da imaturidade que foi a tua despedida e eu, com a alma a sorrir irei afirmar que é tarde demais e que tal como disseste não conheces nada da minha vida. Infelizmente ou felizmente. As minhas mãos vão tremer um pouco e o café vai estar mais amargo do que o habitual mas desculpa, não irei continuar um amor de adolescência na vida adulta e porque de todos os sentimentos do mundo que poderei ter por ti, amor não será um deles. O futuro não nos vai unir por mais que agora o deseje. Desculpa não desculpar-te mesmo que o tempo passe.
As nossas conversas vão ter indiretas sobre o quanto errado foi errar e estragar o que tínhamos. "A serio?" (deveria ter ficado). "Estás incrível!" (não deveria ter ido).
Vai chegar o final daquele encontro casual, "Eu pago o café como sempre fiz" e com essa tua frase irei dar uma gargalhada pequena e olhando-te nos olhos irei perguntar-te "Sabes que o tal como sempre que falas foi há dezasseis anos atrás, não sabes?" e tu com vultos de memórias a aparecerem-te na tua cabeça irás tocar na minha mão e como que num desabafo respondes "como poderia não saber?". Pagas o café, abres a porta e despeço-me de ti com um beijo na cara, dizes que tens de ir e eu de sorriso no rosto digo-te "como sempre".

-mm


domingo, 29 de novembro de 2015

Parece


Parece que ainda nem passou um ano desde o nosso ultimo beijo. E não passou. Mas desde que te deixei de amar parece que perdi a noção do tempo. Parece que a existência de um necessita da existência do outro.
Parece que foi o ano passado que te amava para sempre. E foi. Mas desde que o teu corpo começou a ser apenas mais um na multidão,o sentimento morreu sem ar num jardim que destruíste, o mesmo que plantámos juntos.
Parece que foi há dois anos que te toquei pela primeira vez. E toquei. Mas desde que as tuas mãos percorrem outros corpos e as minhas também, o nosso silêncio partilhado devido a beijos e respirações ofegantes tem pouca importância.
Parece que foi há um ano e meio que fazíamos amor em camas que não eram as nossas. E fazíamos. Mas desde que deixei de te ouvir que não me recordo das noites que passámos acordados a criar amor com suor, com saliva ou apenas com palavras.
Parece que foi há quase dois anos que te conheci. E conheci. Mas desde que te foste embora que não te reconheço então não sei entender se algum dia eu realmente soube quem verdadeiramente és.
Parece que te escrevo por amor. E escrevo. Mas desde que ganhei maturidade entendi que a minha escrita traduz o sentimento que existiu mas que já não existe, seguro sentimentos que já não existem nas frases que coloco em papel.
Parece que já não te amo há meio ano. E não amo. Mas desde do momento que acreditei que quem deixa de amar nunca amou não queria confrontar a realidade então mentia a mim mesma e prometia que te amava quando o que sentia era tudo menos amor, chama-lhe obsessão, rancor ou saudades mas não era definitivamente amor.
Parece que me amaste há uns meses atrás. E amaste. Mas o teu sentimento acabou tão bruscamente e sem explicação que o teu amor hoje a pouco me sabe e todas as memórias que tenho tuas são para me questionar da intensidade do que sentias quando eu estava no pico de qualquer sensação sempre que estava contigo.
Parece que já não estou contigo há uns sete meses. E não estou. Mas qual era a vantagem de te olhar mas não te ver, de te tocar mas não te sentir e como deves imaginar seria nenhuma então não choro ou sinto qualquer tristeza por não trocar palavras ou encontros casuais contigo.
Parece que nunca te vou esquecer. E não vou. Mas vou e já aprendi a viver com o passado que partilhámos juntos mesmo que o presente não nos una minimamente mas agradeço tal facto pois o minimamente mataria-me aos poucos, prefiro não te ter completamente do ter um pedaço o que antes tinha por inteiro.

-mm


 
 

 
 

Perdas e ganhos


Passámos de um amor para uma competição, ganhava quem deixasse de amar primeiro. Ganhaste e como prémio tiveste a culpa e enquanto eu chorava no quarto por te ter perdido tu choravas por teres ganho. Há trofeus que pesam e o do nosso amor morto matava-te aos poucos enquanto a minha derrota deixava-me mais viva a cada dia que passava.
O teu pódio trouxe-te desvantagens ao ponto que quase me dizias que quem tinha perdido eras tu. Eu carregava a vontade de ressuscitar-te e tu carregavas a minha morte em ti já que a taça lembrar-te-ia de mim. As pessoas davam-te umas palmadinhas nas costas, perguntavam ironicamente se tinhas feito batota enquanto que a mim me abraçavam, beijavam a testa e prometiam-me que iria haver um dia que ias aperceber-te do quanto perdeste em ganhar.
Havia regras no jogo e como perdedora limitei-me a desrespeita-las. "Vou partilhar o meu certificado de participação com outro alguém e já não preciso que me limpem as lagrimas que escorrem na minha cara." e a tua frente ganhei um outro jogo. Não se podem ganhar todos e a minha vitória dependeu da tua. Obrigada por teres ganho que eu acabei por ganhar outro jogo apenas porque perdi anteriormente.
Passámos de um amor para um empate de competições. "Deixei de te amar primeiro" ganhaste, "Assumi alguém primeiro" ganhei e no fim perdiamo-nos um do outro. Somos demasiado competitivos para não haver remorsos, raiva ou inveja e não nos deixaram estar na mesma equipa... para te ser sincera, também não saberíamos partilhar o prémio.
Usaste como desculpa de tudo o que estragaste o facto de eu também ter estragado depois mas não entendeste que se nos inscreveste numa competição e eu iria pelo menos tentar ganhar e felizmente ganhei mas isso não é uma forma de apagar o erro que foi teres começado a jogar mesmo depois de te terem contado que é viciante. Não sei perder mas no primeiro jogo não estava a altura de ganhar por isso ficaste com o lugar e tu que carregues a culpa de teres destruído uma história conjunta apenas pela tua competitividade.
Não deixámos de jogar até ao dia que nos proibiram devido a tamanha rivalidade. "Não fales comigo se estás com ele", "Não te consigo olhar da mesma forma", "Magoaste-me demasiado para querer sequer dizer-te uma única palavra." e o valor de todos os ganhos acabaram por se destruírem ao mesmo tempo que nos destruíamos.
Ganhaste primeiro e eu ganhei depois e no meio de tantos jogos não entendemos que estávamos a perdermo-nos. Fracasso.
Estamos no pódio, um ao lado do outro, de coração vazio e de trofeu na mão.

-mm


sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Perder a tampa da caneta


Quando era mais nova e perdia a tampa da minha caneta entrava em pânico enquanto via todos os meus amigos a colocarem uma tampa de uma caneta sem tinta para tentar não aumentar os estragos, para tentarem não ficarem sem tinta naquela que ainda lhe restava. Chamo-lhe ingenuidade de criança mas ainda hoje continuo assim. Vejo todos os meus amigos a taparem amores com outros que não se encaixam como deviam, vejo todo o mundo a tentar não acabar com a tinta em vez de aceitarem um final e chorarem. Pessoalmente prefiro não ter nada do que ver a minha caneta com uma tampa completamente diferente, há combinações que que não devemos criar só para substituir o vazio ou porque não aceitamos o final de algo. Olho em volta e todo o mundo escreve e eu choro noites sem fim por não haver nem uma réstia de tinta na minha caneta e eu juro que a escrita é fundamental para mim. Não sei avaliar se torno as coisas complicadas ou se todos os que estão a minha volta preferem tornar tudo tão fácil mesmo que abdiquem do sentido de algo. Prefiro acabar tudo de vez do que carregar no meu estojo uma caneta que um dia vai acabar por deixar de escrever e que andei a guardar com uma tampa que não era dela originalmente apenas para me proteger. Se a minha grande paixão é a escrita só devo entregar ao papel palavras criadas com a tinta de uma caneta que seja inteiramente perfeita a meus olhos. Dói-me dizer adeus mas pelo menos não ando a negar o que se nota a olhos vistos, o facto de que a caneta já não vai ser a mesma com uma tampa diferente.

-mm



quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Felicidade


O nosso grande problema está no facto de compararmos a nossa felicidade a todos os momentos que fomos felizes, de tal maneira que nos impede de contemplar tudo aquilo que temos a nossa frente. Imensas vezes numa situação onde poderia ser completamente feliz eu não me deixei ser por encontrar memórias onde na minha cabeça estava a sorrir mais ou estava com outras reações que faziam de mim uma pessoa visivelmente feliz.
Sempre discordei com a frase que afirma que nós mesmos comandamos a nossa felicidade, é completamente impensável dizer a alguém triste que ela tem o poder de se fazer feliz pois não é definitivamente escolha da mesma estar naquele estado de espirito mas atualmente tenho outra visão sobre diversas situações, há muitas onde estamos infelizes porque estamos perante problemas que não sabemos resolver ou mesmo sem resolução mas há outro género de infelicidade, aquela que nem a própria pessoa entende a razão de estar triste, é revoltante pois parece que tudo o que provamos atualmente não se compara aquilo que tínhamos. Cansei-me diversas vezes de tentar ser feliz quando a meus olhos eu sabia que podia ser mas não o era por nenhum motivo em especial até que um dia apercebi-me que eu mesma não me dava oportunidade devido a comparar tudo o que tinha sido com o que era.
Nós como seres humanos minimamente racionais entendemos que a felicidade que tínhamos com um ano de idade ao receber um brinquedo não vai ser a mesma se o recebermos atualmente, ou a felicidade de ler um texto sem erros quando se tinha seis anos e agora também não, assim como um novo amor não vai saber ao mesmo que o primeiro ou segundo, o estar solteiro não vai ser igual a quando se estava numa relação e todos os momentos devido ao facto de que o tempo passa e com ele nós envelhecemos e as situações mudam, logo vão saber a algo diferente, o ser feliz não vai ter o mesmo paladar e portanto logicamente e para bem de nós mesmos devemos parar de comparar o passado ao presente porque o bom de tudo está na diferença que ambos têm. Qual era o interesse de ser sempre feliz da mesma maneira? E qual seria o sentido da vida mudar e a felicidade ter exatamente o mesmo sabor?
Exigimos muito da nossa existência, exigimos até situações impossíveis. A felicidade está na racionalidade e na consciência que o que temos sabe ao "agora" e nunca ao que já soube. É impossível seres feliz com alguém da mesma maneira que foste com outra pessoa porque tanto tu mudaste como a pessoa não é igual, é impossível deslumbrares-te com situações que antes eram especiais e que agora se tornaram diárias e não tens de pedir desculpa por isso mas encontrar uma pequena felicidade nisso, é impossível que a terceira vez que faças algo saiba ao mesmo quando a fizeste pela primeira vez porque o tempo muda tudo, até a forma como encaras a felicidade. E devemos aprender a ser felizes, desculpem mas maior parte das vezes está nas nossas mãos.

-mm


terça-feira, 24 de novembro de 2015

Fantasma que sou


Soubemos dar um final delicado mas de tão delicado que era acabou por se partir em peças que não conseguimos voltar a encaixar. Errámos muito um com o outro mas só depois de termos desistido. Foi a desistência mais cruel devido a doçura que teve, devido a todas as lágrimas que escorriam e devido a todos os "amo-te" que saiam de ambas as bocas. Sempre acreditei que o fim de algo tinha como principal razão a falta de amor mas de tudo o que nos faltava, sentimento não era.
Pertencias-me tanto quando a sós falávamos da vida que levávamos em separado mas criavas em mim uma tempestade enorme sempre que te via de mão dada ou a sorrir para faces que não eram a minha como sempre tinha sido. Se me amas porque me trocas? e se não me amas porque sempre voltas?, aos poucos diversas questões como estas matavam o resto de mim que havia na minha existência que era tua.
Estragámos tudo quando terminámos algo antes do suposto pelo medo de estragar o que tínhamos. Somos muito idênticos e mesmo que tal característica fosse boa não havia maneira de nós sabermos lidar com ela. Todas as ações que separados fazíamos acabavam em um pedido pessoal de perdão para ambos, "desculpa mas acho que o sinto não é amor", "desculpa mas ando a encontrar-me com outro alguém" e o pior de todos "desculpa-me mas acho que te vou amar para sempre mesmo que não te ame".
O nosso amor estava em coma e o primeiro a desligar a maquina seria o corajoso e cruel. Sempre preferi morrer do que matar e tu por me amares tanto lá me fizeste a vontade e acabaste com a minha vida. Espero que saibas que pelo meu egoísmo eu nunca desligaria a maquina que nos ligava, mesmo que já não te ouvisse, sentisse ou te pudesse beijar sabia que de alguma forma estavas lá para mim. Percorri todos os corredores do hospital como fantasma que era e durante meses via-te a chorar na minha campa quando por um acaso da vida tu entendias que a decisão que tinhas feito tinha sido definitiva e que definitivamente me querias mais um pouco viva, abraçava-te sempre que te via com flores na entrada do cemitério mas tu pelo diabo que é a realidade não me sentias quando tudo o que vias eras tu. As tuas visitas deixaram de ser cada vez menos regulares ou quando vinhas nem uma pequena flor me trazias e eu em vez de te tocar, chorava por nem te sentir. Estavas a morrer aos poucos e era a minha vez de desligar a maquina, adiei o dia, a semana e o mês e ouvia todos a dizerem-me que manter-te era um ato de egoísmo que me mataria depois de morta. Ria-me deles. Como matar um fantasma? E fui morrendo de dia para dia tentando não encarar o obvio. Fantasmas morrem. Depois de quase morta duplamente, com as minhas mãos a tremer e sem forças desliguei a possibilidade de te ver meio vivo. Se nunca aceitei metades teria de aceitar a tua morte completa e saí do hospital com o termo de responsalidade assinado por mim e eu nem sabia que fantasmas podiam escrever. Não recebeste flores porque se te matei nunca terei coragem de te encarar pálido e com o coração sem batimentos, nunca tive uma tentativa de te reanimar mesmo sabendo que houve meses seguidos onde tu tentavas tal coisa devido a toda a culpa que depositavas em ti. Despois de morta não podia estar mais viva e a vida deu-me a vantagem de não conseguir ver quem eu matei para encontrar a minha paz então, devido a isso, não sei onde andas e se alguém te oferece flores ou se na tua cama conseguem ler o homicida que foste por amor.
Preferias ter-me morto com um bala do que me teres visto tão quieta e frágil numa cama de hospital onde metade dos médicos te pediam para tomares a decisão de desligares o que me mantia viva e os restantes afirmavam que o que tinhas de mim a partir daquele momento seria apenas memórias e o meu corpo a tua mercê mas suplicavam que não tomasses a decisão de desistir. O que seria os sinais vitais se já estava morta para ti? Não seriam nada e devido a isso puseste fim a tudo o que eu era e tudo o que eu fui um dia. Eu também preferia nunca te ter matado apenas porque morri um dia para ti.
Tornaste-me a mulher mais viva e mais morta a teu lado. Morri diversas vezes devido a ti quando tudo o que fazia era ressuscitar-te mas depois de ter envelhecido como fantasma nunca estive tão viva. A tua morte alimentou a minha vida e quem diria que os fantasmas a têm.

-mm